sábado, 29 de outubro de 2016

Candeeiro alemão com motivos marítimos e de caça (1890 a 1920)



No ano passado entrei numa loja de velharias e quinquilharia, à procura de peças para candeeiros. Na loja tinham algumas chaminés, alguns quebra-luzes e candeeiros, na maioria em vidro opaco. No fundo de uma prateleira estava um em metal. Peguei nele e verifiquei que o queimador estava partido. Tem nas duas faces um medalhão, ladeado por dois peixes em relevo. A cena em cada medalhão é um barco, com dois homens encapuçados e com dois remos. O fundo é dois navios à vela, tendo o do lado esquerdo só uma vela. Achei piada ao candeeiro por causa dos motivos marítimos, associei-o a Portugal, por causa do mar e dos motivos estilizados. Deixei o candeeiro na loja e fui-me embora.
Esqueci-me do candeeiro e passados uns meses fiz o abat-jour em cartão com o título L`Hiver au Pole-Nord, da Imagerie d'Épinal e já publicado aqui.
Neste verão comprei um queimador Kosmos, no tamanho 10, da manufatura alemã Brökelmann, Jäger und Busse GmbH & Co, numa feira de rua.
Tinha estes objetos soltos quando, de repente, os associei ao candeeiro da tal loja de velharias. A minha preocupação era o queimador ser no tamanho 8 ou noutro qualquer, o que impossibilitaria que se enroscasse o queimador que tinha comprado na feira.
No dia seguinte passei na loja e ainda lá estava o candeeiro, quase um ano depois de ter lá estado. Estava na mesma prateleira esquecido e no mesmo estado.
Peguei novamente nele e num átimo associei logo o abat-jour. Verifiquei se tinha marcas, se tinha um reservatório em vidro (na altura não me pareceu que tivesse) e outros pormenores. Pus o dedo no fundo do reservatório e como estava com sujidade pareceu-me metálico e o candeeiro ser uma peça única. Não estava com buracos, como alguns que aparecem no mercado e outras imperfeições. Nesse dia, ao sair de casa, tinha-me esquecido do queimador para verificar a medida de rosca.
O candeeiro é comum mas, com aquele abat-jour ganhava logo outra graça. Perguntei quanto era e pedi para mo reservarem.
No dia da compra tinha levado dois queimadores, entre eles o que tinha comprado da Brökelmann, Jäger und Busse. Desenrosquei o original e enrosquei este último. Felizmente são do mesmo tamanho. Outra coisa que constatei foi que de facto o reservatório é em vidro. Como a tampa estava colada à base não se notava.
O primeiro passo ao chegar a casa foi lavar o candeeiro. Para o desengordurar e tirar toda a sujidade. A tampa com o reservatório saiu e no interior tinha papéis de jornal, para dar altura e apoio ao reservatório. Este tinha uma camada grossa de gesso pouco usual. O que aconteceu foi que a determinada altura o reservatório soltou-se do gesso, daí ter sido posta uma camada por cima da original. O reservatório tinha ficado mal colado. No outro dia mergulhei-o em água e com muito cuidado removi todo o gesso. Depois foi fazer gesso novo e colar.
O próximo passo foi pensar qual o tipo de revestimento mais adequado. Depois de ouvir algumas sugestões optei por uma cor escura e o candeeiro ficou impecável e próximo ao original.
A nível dos queimadores foi uma feliz coincidência. O original também foi fabricado pela Brökelmann, Jäger und Busse. Ambas as marcas são do período posterior a 1895 até cerca de 1920.

O candeeiro é uma junção curiosa de temas.
Como foi dito as cenas principais são alusivas ao mar, à faina e aos peixes. Os respetivos medalhões têm folhas estilizadas. No topo há uma corda e o remate superior tem conchas. Este é o corpo principal do candeeiro. A este corpo foi fundida a base mas, com temas diferentes. A base tem peixes e aves (parecem ser patos), entre tabuas, como se estivessem nas margens de um lago, de um rio ou do mar. Estas estilizações coadunam-se com as da tampa. Esta tem motivos estilizados de folhas, bagas, intercaladas por cabeças de cão de caça e javalis. Como estes candeeiros eram fabricados em larga escala, trocavam os moldes entre si, criando assim uma infinidade de peças. A preocupação na sua conjugação correta não parece ter sido determinante no produto final. Os nossos homens no barquinho podiam estar a aproximar-se das margens, onde possivelmente iriam pescar ou caçar.
Numa pesquisa pela internet encontrei um queimador com uma tampa igual à deste. A base tem estilizações e cabeças de gato. O corpo principal tem simbologia maçónica, envolta por estilizações ao gosto setecentista. A cor do revestimento é também escura mas, num tom mais acobreado. O reservatório não é o original, tendo sido substituído por um frasco comum de vidro. O candeeiro não tem queimador.
Noutra pesquisa encontrei um candeeiro com as mesmas proporções que os anteriores e um queimador arruinado da Brökelmann, Jäger und Busse. A cena principal é uma mulher e uma rapariga a fiarem.

Estes candeeiros são exemplificativos da produção em massa. O zinco é um metal maleável, de baixo custo e perfeito para se criarem um sem fim de modelos. O revestimento podia ser metálico, no caso de candeeiros de melhor qualidade, ou pintado, como os atrás descritos.
No mercado nacional geralmente estes candeeiros são descritos como bronze de arte. Ainda está por apurar a correta atribuição na nossa língua para este tipo de metal. Nos catálogos de época estrangeiros são descritos como de zinco ou imitação de bronze. Eram e são candeeiros comuns mas, os preços praticados entre nós são, em alguns casos, injustificados para a sua qualidade.




O candeeiro no dia da compra após a primeira limpeza (três ilustrações).




O reservatório durante a limpeza e colagem.




O candeeiro depois do restauro (seis ilustrações).




O candeeiro com o abat-jour e respetivo suporte pela chaminé (cinco ilustrações).




Os queimadores Kosmos da manufatura Brökelmann, Jäger und Busse, publicados por Jacques Goldberg, em 1906, na obra Die Deutsche Lampe. O design é o que se aproxima mais dos queimadores em questão.




Os queimadores Kosmos da manufatura Brökelmann, Jäger und Busse, publicados pelo mesmo autor mas, em 1911, na obra Die Deutsche Lampe. O design é ligeiramente diferente na galeria.




O candeeiro com referências maçónicas, em zinco, e com a mesma tampa (duas ilustrações).

Ilustrações retiradas da internet.




O candeeiro com figuras femininas a fiarem.

Ilustração retirada da internet.